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quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Hoje: Advérbio de tempo "perdido"


Faz tempo que não escrevo, a não ser por definições do meu ofício profissional, mas, essa escrita solta, livre das convenções imediatas tem sido algo ausente, ao menos nesta tão saudosa página. O que tem me faltado é o brio da escrita, os impulsos notórios que me levam a escrever, visto que as inspirações reflexivas têm sido deixadas em segundo plano na medida que a ocupação rouba-me o tempo, embora, este meu tempo gasto no cumprimento de deveres ainda não se encaixe no tempo perdido que hoje chama-me a atenção e ao qual destaco na presente escrita.
 Nesse momento, enquanto o sono não retorna ao seu lugar de origem e minhas pálpebras insistem em procurar motivos para manterem-se abertas, penso nesse hoje, alvo de tantas frases feitas: " Viva o hoje, como se o amanhã nunca fosse existir;Só consigo deixar o hoje, melhor que o ontem, se eu quiser;É preciso viver o hoje porque o amanhã é incerto." Hoje, porém, esse tempo tão venerado parece se chocar com nossas percepções do que o agora retrata diante do futuro que pode ou não acontecer.
 Ainda me surpreendo com minha capacidade de me surpreender, o hoje às vezes me assusta, pois, é dele que dependo para que o amanhã aconteça, visto que  na progressão dos dias o hoje sempre vem primeiro, porém, é o amanhã o que de fato importa. Vejam bem, se pensássemos só no hoje não faríamos tantos planos, não trabalharíamos tanto para garantirmos um bom futuro, não se passaria pelos anos iniciais de estudo almejando uma faculdade, não quereríamos esforçarmos-nos  para que os filhos vivessem bem, não pensaríamos em acúmulos, nem sonharíamos com os amores eternos. Se o amanhã não tivesse peso maior que o hoje em nossas perspectivas, a ressaca não faria do momento de brindes um arrependimento, os erros não seriam parte tão insistente de nossos dias, a desculpa seria palavra inexistente, a morte não causaria tanto espanto. Ainda me surpreendo sim, com o que temos feito do nosso presente para que o amanhã tenha pesado sua mão quando chega entre a madrugada e o amanhecer.
 Ao abrir aos sites de notícia vejo os reflexos repudiantes dos imediatismos e constato que o ser humano já se apoderou tanto de sua ousadia milenar, que confunde seu livre arbítrio com o livre arbítrio do outro, e se sente dono de sua liberdade e da liberdade do outro a ponto de apoderar-se desse direito seu e também do direito do outro. Ainda consigo me estarrecer com a quantidade de notícias que invadem nosso consciente ou inconsciente quando abro esses sites de notícias: são pessoas, em sua maioria jovens, se apoderando do direito à vida que é do outro e fora dado por Deus ( há quem acredite que não, o que também lamento muito), homicídios, latrocínios, corrupção, roubo, abusos de poder, maus tratos,   uma série de coisas que me causam repúdio e tristeza, e o pior, já não precisamos nos retratar nos temores das grandes cidades, porque está muito mais próximo do que ontem podíamos imaginar. Vejo hoje, a hipocrisia, as blasfêmias, a ignorância verbalizada, a falsa necessidade da tolerância, máscaras caindo, máscaras sendo postas, a ausência do desejo de esforços para a conquista de algo quando se tem a facilidade medíocre que quer sempre algo em  troca, política suja, sujeira em baixo do tapete, olhos vendados e discursos de falso moralismo. Pergunto-me: Como será o amanhã com o hoje que temos tido? Ele de fato virá? Será ele tão assustador quanto o hoje tem se mostrado? E para essas questões não tenho as devidas respostas.
 Hoje o ponteiro do relógio e o marcador do calendário recordam-me das urgências do hoje. Faltam poucos dias para definirmos quem nos represente em nossos municípios . Mais uma vez plantaremos no hoje as sementes do porvir. No hoje vejo um reverberar de promessas e propostas e mocinhos e, quando chegar o tão ansiado dia em que o "confirma" é a chave de nossas esperanças, mais uma vez estaremos com a responsabilidade do hoje para um futuro de quatros anos. Não sejamos portanto, apolíticos e acríticos como muitos afirmam ser, sempre estará no hoje as definições desse amanhã que sequer está em nossas mãos, que o amanhã é indecifrável eu concordo plenamente. Hoje somos, amanhã, já dizia minha querida mãe, " a Deus pertence". Entendam que não estou refletindo sobre política, mas, se é esta a realidade de hoje, o que posso fazer?
 Termino então com a lembrança dos versos cantados da Simone: " Como será o amanhã? Responda quem puder. O que irá nos acontecer? O meu destino será como Deus quiser."  Eu digo porém, que o hoje é tão valioso quanto semear canteiros, se ontem eu lancei a semente, hoje preciso regá-las para que amanhã as flores cultivadas possam servir-me de perfume ou de enfeite para os túmulos de nossas recordações. Que não permitamos que do hoje, se façam tempos perdidos.
POR: ADRIANA PESCA

terça-feira, 26 de junho de 2012

A escrita pede passagem


Hoje me senti um pouco mais feliz pela minha tristeza, ela trouxe de volta ao meu âmago esse desejo da escrita, tão ausente em mim nos últimos tempos, talvez porque a felicidade tenha estado presente há tanto tempo que não havia tempo pra pensar na minha tão necessária arte de escrever, parece-me que por um momento, a borboleta pousada em meu ombro, embasbacou-me com sua beleza e impediu-me de refletir, visto que minhas reflexões nascem do desejo de ver e mostrar o que ninguém mais tem visto e isso surge exatamente da nostalgia, do desencanto dos instantes de tristeza, sentimentos esses que parecem não dormir conosco, mas, que ao amanhecer instalam-se em nosso interior, sem porquês obrigatórios, apenas estão lá. O efeito da felicidade, no entanto, parece-me estagnar, passo a senti-la de tal modo, que me recuso a escrever, já que escrever vem a mim como algo nato movido pelo sentimento das ausências.  É bom sentir de novo que volto a mim e, desse modo, posso apresentar o que de mim é essência.
Durante este tempo em que me ausentei da escrita, estive em muitos lugares e partilhei sensações diversas, olhei rostos, partilhei sorrisos, caminhei por diversas calçadas com intenções, sem intenções... Apenas caminhei. Sonhei dormindo, sonhei acordada... Apenas sonhei... Sorri pra pessoas, sorri de pessoas... Apenas sorri. Amei, mas, não apenas amei, amei e partilhei amores, com a sutileza de quem oferece, para a recepção do que vem em troca, porque dizer que sempre damos sem esperar receber é pura hipocrisia... Sempre esperamos, e como esperamos. Encarei a vida e ela me encarou de volta.
Ao retornar a estas linhas, tão deliciadamente redigidas, penso que, se não fossem os momentos de sobriedade, a embriaguez de alguns momentos não nos faria tão felizes, e não falo de embriaguez alcoólica, falo da embriaguez da vida e dos sentimentos sem razão. Se não fossem as tolices o que saberíamos sobre ser sensatos; Se não fossem as tristezas que nos são impostas, ou que chegam sem convite, apenas por chegar, não teríamos tanto apego ao que nos torna felizes; Se não fossem as lágrimas para lavar nossa alma, não saberíamos jamais que o sorriso é tão fascinante. Somos assim, metade, metade, e metade, inteireza. Quem pode procurar o que não se perdeu ou perder o que nunca se teve? Somos sim contradição, e isso eu sem bem o que é. Todos os dias, componho linhas imaginárias, porque vivo a escrever em pensamento, na alegria ou na tristeza, na saúde ou na doença, como num matrimônio eterno entre o pensamento e a escrita.
Eis que novamente, a escrita pede passagem, quis sair de sua reclusão para novamente pousar no papel. Ainda movida pelas incertezas que causam tantas certezas imaturas, mas, que sabem bem que nascem por uma motivação maior. Porque escrever não é uma convicção plena de liberdade, mas, uma liberdade plena de convicções, é antes uma “parição metamorfoseada” que surge das minhas próprias contradições, como numa divisão entre o que sou o que eu gostaria ser e o que os outros gostariam que eu fosse três que se fundem, mas, no fim dão espaço a uma terceira pessoa, o nós, sempre presente, visto que sou sempre um ser pluralizado.
De novo, apresento-me aqui, nessas linhas tão desejosas de existir, que traduzem meus pensamentos precocemente envelhecidos, como se eu mesma, fosse o retrato presente  do meu passado futuro... Ambiguidades??? Talvez! O que quero, é retorno, é reencontro, é renascimento. A escrita pede passagem, e eu, como aprendi que devo sempre dar passagem a quem chega, deixo-a novamente chegar, mas, não somente passar, que chegue e permaneça. 

Adriana Pesca

terça-feira, 15 de maio de 2012

Realidades desconfortantes


No cenário de nossas vivências rompem-se fios da teia da vida. Todos os dias as cortinas se fecham para vidas ainda latentes, são tristezas anunciadas que retiram de nós as esperanças de um mundo melhor. Rostos de uma juventude que grita por vida, perdem-na por banalidades. Pra nós, cujo pensamento acredita na bondade humana, é algo incompreensível.
Cada vez que somos obrigados a pensar na vida como algo finito, somos por consequência, arrancados de nossa inércia. No entanto, aceitar essa condição de finitude é algo que não cabe em nosso entendimento, somos humanos em demasia e é de nossa condição não aceitar as perdas.
Há um inconformismo por trás das aceitações, há medo por trás das barbáries, é triste ver que jovens têm tido suas vidas ceifadas e vê-las justificadas pela procura inevitável na escolha errada da porta larga, em outras palavras, é achar compreensível a sentença de quem, com as próprias mãos, a escolheu e a acolheu para si.
Meus pais me ensinaram que caminhos eu deveria escolher, não o impuseram, apontaram a direção e seguiram junto comigo. Pergunto-me: Será que nossos pais de hoje não têm percebido que, ao se omitirem, apontam um caminho sem volta?
Cada vez que anunciam violência gratuita, vidas ceifadas são manchetes alarmantes e omissões que calam os gritos de desespero por trás do medo, em meu silêncio eu também choro, choro pra dentro porque temo que em minha juventude o mundo me pareça tão velho e calejado de esperanças, me dói pensar que para futuramente ter um filho precisarei antes de qualquer coisa construir sua redoma e, ainda assim continuar a temer e lamentar por tais prisões.
Realidades desconfortantes que me fazem pensar no hoje muito mais do que no amanhã... Realidades inexatas que flagelam minha alma e fazem-me desejar beber cada gota de felicidade que me é oferecida, e amar mais os meus pais, e a elevar mais orações e pedidos de proteção aos céus. No desconforto destas realidades, o que me conforta é saber ainda há quem semeie o amor e então, ainda é possível que colhamos alguns de seus frutos.
TEXTO: ADRIANA PESCA